Alucinações ou não? -PARTE 2-


    CONTINUAÇÃO...                                                                      



 
– Acordei totalmente suada, como se tivesse corrido muitos quilômetros. Que sonho fora aquele?! O dia mal tinha amanhecido, mas era possível perceber o clima lá fora; chuva intensa, acompanhada de um vento uivante. Resolvi tomar um banho para relaxar.  Depois de alguns minutos demorados embaixo do chuveiro, a luz começou a oscilar. Saí imediatamente, mas mal tive tempo de enrolar-me em uma toalha e a luz acabou por completo.

Por sorte meu quarto era bem iluminado, apesar da chuva que tornava o cenário mais sombrio do que o habitual. Vesti-me e fui até a cozinha, quando ouvi a campainha quebrando aquele silêncio que só quem mora sozinho conhece.

Ao abrir a porta, porém, senti qualquer vestígio de tranquilidade esvair-se: era ele, o homem do meu pesadelo! Manuseando sua motosserra, ele se aproximou abruptamente, eu não tinha como escapar!



“Senhorita?” – eu ouvi ecoar no mais profundo do meu subconsciente, aos poucos, retornei daquele pesadelo acordada. Sim, havia um desconhecido em minha casa, e não, ele não havia saído de um dos meus mais intrigantes pesadelos para continuá-lo na realidade.

O cara que estava tentando insistentemente me acordar, com uma expressão assustada no rosto, era apenas o carteiro que trazia uma encomenda endereçada a mim. Ah, finalmente meus remédios haviam chegado! Assim que o tranquilizei, de maneira convincente o suficiente para que fosse embora, abri a pequena caixa que continha meus medicamentos para o tratamento da minha esquizofrenia paranoide, surpreendendo-me ao ver um pequeno bilhete posto entre duas das caixas, que dizia:
                                                                          
"Querida Mary,

Há muito tempo não vem ao meu consultório. Gostaria que viesse, o mais breve possível, para que eu possa avaliar o seu estado. Talvez, os remédios nem sejam mais tão necessários.

Atenciosamente,

Dr. Willian A. Sanders"


O velho doutor continuava preocupando-se comigo, mal sabia ele o quanto eu dependia desta medicação para manter-me lúcida. Desde a tragédia que aconteceu com minha família, há nove anos, eu não tinha ideia de como era viver sem estar dopada, sem o efeito das drogas a que eu costumava submeter-me e que só o Dr. Sanders era capaz de fornecer-me sem uma consulta em mais de quatro meses. Decidi vê-lo na próxima semana, enquanto engolia dois ou três comprimidos de Risperidona e Clozapina num coquetel antipsicótico de uma só vez.



Durante toda aquela semana, o mesmo pesadelo me perseguiu. Todas as noites aquele sonho macabro estava lá, esperando que eu fechasse os olhos para, então, revelar-se. Contudo, os remédios não permitiam que eu voltasse a ter alucinações quando estava acordada, o que já era um grande progresso.

Na segunda-feira seguinte, fui até o consultório psiquiátrico do doutor, que me esperava com o mesmo olhar fraterno que adquirira com o passar dos anos. Conversar com ele, ainda que sobre o assassinato de meus pais, fazia-me sentir melhor, aliviada até.

– Seu estado de saúde parece estável Mary, mas os remédios ainda não devem ser dispensados. A propósito, achei que te interessaria saber que aquele maníaco homicida do Edmund Banks foi transferido do presídio para o sanatório estadual porque apresentou comportamento típico de alguém com perturbações mentais.


 

 –Então o louco que matou meus pais, fazendo-me ficar sozinha no mundo aos onze anos de idade estava recebendo amenização de pena?!” 
 
Essa pergunta acompanhou-me durante todo o caminho de volta para casa, trazendo lembranças de tudo o que eu passei até então – os anos como interna no hospital psicoterapêutico, a mudança para a casa de minha única tia, a morte dela no ano passado, a vida solitária desde então, os remédios, as crises… Já bastava! Eu precisava libertar-me de todos aqueles sentimentos ruins e só havia uma forma de fazer isso: acabando com a origem de todos eles.

Aquela noite foi longa demais para mim, repleta de cenas da minha infância entrecortadas de pesadelos que invadiam o meu sono. Acordei decidida a ir até o sanatório onde Edmund estava, eu precisava olhar o rosto do culpado por todo o meu sofrimento. Chegando lá, não encontrei resistência para fazer-lhe uma visita, após apresentar um crachá falso de um jornal qualquer, mas fui alertada em relação ao que eu iria encontrar – nada que eu já não esperasse.

Segui um guarda por um longo corredor branco, até que paramos em frente a uma porta de metal. O guarda não hesitou em abrir a porta e conduzir-me para dentro da cela, dizendo-me que estaria do lado de fora caso eu precisasse. Assenti com a cabeça e, de repente, dei-me conta de que estava a poucos passos do homem que acabara com a vida de meus pais e, de certa forma, com a minha.

Ele virou-se ao perceber minha presença, estava contido em uma camisa de força, olhou firmemente para mim. Mesmo não sabendo quem eu era, ele certamente achou estranho o fato de estar recebendo uma visita, aproximou-se de mim. Eu não sabia o que fazer, como agir, sequer sabia o que estava sentindo, eu deveria odiar esse homem, mas como seria possível odiar alguém tão belo?!

                                                                       



E como eu podia ter a estranha sensação de já tê-lo visto, assim como estava? Eu mal lembrava seus traços, era só uma garotinha quando vi suas fotos estampadas em um jornal velho que anunciava sua condenação. Ainda próximo à mim, ele não parecia capaz de causar um mal tão grande quanto o que eu havia sentido na pele…

O tempo que passei com Edmund, o assassino, não comportou nenhum tipo de conversação, mas despertou em mim um sentimento indefinível. À noite, durante meu sono, o pesadelo ressurgiu e eu acordei alarmada com a descoberta que ele me havia proporcionado – o assassino de meus pais era, ao mesmo tempo, o personagem principal dos meus pesadelos!

Esperei até que o dia amanhecesse e voltei ao sanatório. Porém, ao chegar lá, percebi que algo estava errado, havia muitas viaturas da polícia e também ambulâncias. Não demorou para que eu ficasse sabendo o que acontecera – Edmund Banks havia fugido!

Quando o enfermeiro levou seus remédios pela manhã, ele o rendeu, quebrou seu braço e desapareceu, deixando apenas um bilhete que me fora entregue pelo inspetor de polícia. Com letras garrafais, podia-se ler:

"Eu sei quem é você. Não se preocupe, isso está apenas começando meu amor…"


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